Aproveitou uma ida ao Bairro da Bica e de Santa Catarina e por ali se ficou um pouco. Fazia tempo que não andava por aqueles lados... o miradouro a perder-se de vistas sobre o Tejo e a outra margem, o Adamastor, o elevador da Bica, o Largo de Camões, o Largo do Chiado e, inevitavelmente, a Brasileira do Chiado.
Veio-lhe a vontade de um café e de um pastel de nata. Mesmo acabados de fazer, a transbordar de canela, com um cheiro, um aroma, irresistíveis.
Procurou uma mesa desocupada naquela esplanada soalheira, repleta de gente: turistas de câmara fotográfica em punho, com plantas da cidade abertas sobre as mesas, um ou outro cidadão pacato na leitura do jornal diário, mas nada mesas nem de cadeiras livres.
E a bica a arrefecer e o pastel de nata a esmorecer...
Uma cadeira livre, estranho ser de bronze, uma mesa, metade livre, com um tipo estranho, do outro lado, sentado, a ler uns papéis, de chapéu, tão absorto na leitura que nem deu pela pergunta se se poderia sentar naquela parte da mesa.
Como quem cala consente... assim concluiu, e ali se sentou a saborear o seu pastel, ainda morno e de massa estaladiça, a bebericar a bica, também já morna, e a olhar quem passava; não viu a menina das tranças pretas, nem o Chiado, do alto do pedestal, a declamar.
Mas, o que se deu conta, de repente, foi que estava ali, sentado, ao lado do seu poeta, o dos heterónimos, o fingidor... nunca lhe tinha acontecido isto: estar a beber a bica com o Pessoa, em pessoa.
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