domingo, 28 de fevereiro de 2010

CASTANHAS ASSADAS

Àquela hora, a animação e o movimento davam conta da pequenina praça onde se situa a Fontana de Trevi. No meio do cantarolar italiano, o inglês americanizado dominava o linguarejar daquela turba de pessoas: as poses para as fotografias a testemunhar o "eu estive aqui", as luzes dos flashes, o atirar da moeda para dentro de água a querer garantir o "eu hei-de voltar, de novo aqui" são a constante daquele lugar que, durante a noite, ganha um carisma especial.
Também a Praça de Espanha e a sua escadaria, cheia de pessoas, cheia de vida e de sons feitos mistura de falas, de pregões, de músicas de rua, tem um sabor mais especial à noite. Um sabor feito, também, com cheiros de algodão doce e, sobretudo, de castanhas assadas. Caras, mas de bom tamanho e inconfundíveis no aroma e no paladar.
O saborear das castanhas, por momentos, transporta-nos o pensar para a terra lusa, um pensar curto e breve que, como o eco, é rapidamente devolvido ao local que nos rodeia. É que é necessário continuar a cumprir com a máxima universalmente estabelecida: "em Roma, sê romano".

sábado, 27 de fevereiro de 2010

VENTANIA

A estrutura abana, o vento sibila gritante, com sonoridades muito fortes, como roncos de um Adamastor a despertar, assustador e medonho. A chuva, acelerada por este vento possante, bate com força no rosto, castiga o corpo, ensopa as pernas e os pés mal protegidos.
Na paragem do autocarro vai esperando, com a mala de viagem a seu lado, o BUS que tarda. Não há um canto onde se abrigar e não tem outro remédio se não aguentar, estoicamente, a ventania que o envolve. Mas a expectativa de uma jornada diferente anima-o, desperta-lhe um sorrir mal disfarçado nos lábios.
Por vezes também é assim na vida: temos de aguentar, com coragem e com determinação, as intempéries do dia a dia, as agruras das pessoas, os derrotes... mas temos, também, de saber olhar em frente e deixar, sempre, que o sorriso do viver nunca nos abandone.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

LUTO

Chora-se sempre a perda de uma vida. Mas quando a proprietária dessa vida nos toca de alguma maneira, quando a convivência foi longa no tempo, quando os afectos se enraízam, a comoção da partida atinge-nos de forma mais especial.
Um adeus sentido. Até ao reencontro.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

REGRESSO A TI

De partida e preparando já o retorno.
Com saudades curtas porque a Itália vai preenchendo, este ano, uma boa parte da agenda das viagens de sonho.
Roma, a próxima, uma promessa de aniversário a cumprir, imaginando boas conversas e muita cumplicidade. Visitando a bela e monumental cidade, mas também Nápoles, Vesúvio, Sorrento, Isola de Capri... Um roteiro preparado há muito tempo: feito com afectos, com entusiasmos. A juntar às 50 recordações carinhosamente reunidas ao longo dos tempos próximos passados e bem escondidas de curiosidades alheias.
Depois, e de novo, Florença, San Giminianno, Siena, Pisa locais para re-reviver: espero que, desta vez, com alguma primavera a acompanhar.
As notícias e os relatos deste REGRESSO A TI, Itália, irão saindo.

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

ACONCHEGO DE TERNURA

ELA: Enquanto dormes... Existe uma ponte e não é distante, onde me leva em pensamentos e por desejos faço-me presente diante de ti... Tudo em ti repousa...Envolvo teu mistério irredutível numa cálida atmosfera de amor e compreensão, enquanto dormes...

ELE: E quando acordo... tua presença, mesmo distante, faz-se sentir em mim, na cálida e envolvente atmosfera de amor e compreensão.
E quando o olhar se abre vejo... teus olhos doces, teu sorriso brando, a repousar sobre mim, qual lençol de seda que me afaga.
E quando me levanto da cama... sinto teu abraço quente, teu corpo se encostando ao meu pedindo aconchego de ternura.
E quando te beijo... nossos lábios sabem ao que procuram.
... não me acordaste, eu é que despertei para ti.

LUGARES DE SONHO

Em Florença existem lugares de sonho, locais onde, só pelo facto de se estar, de se respirar o ambiente, a alma fica cheia e os sentires plenos de imenso bem-estar. Existe um pequeno café, quase no final da ponte Vecchio, junto à margem oposta à da cidade, onde se materializa bem esse sonho de lugar.
O fim de tarde escurecido ainda mais por nuvens ameaçadoras de chuva grossa e bem molhada aconselhou-me a procura de um refúgio e para lá me dirigi guiado por memórias recentes de outra vinda aqui.
E ali fiquei, esquecido do tempo, com um livro a servir-me de companhia. Apreciei quem estava, olhei quem entrava e quem saía. Não dava para ouvir as conversas, que eram feitas em tom adequado à tranquilidade do local. Tomei, com o tempo que queria, uma infusão de maçã e canela e saboreei um bolo de chocolate, daqueles que se derretem na boca com a volúpia de uma gula mesmo pecaminosa... até deu para lamber os dedos!
Assim me deixei ficar, meia hora (?) uma hora (?), não sei! Só sei que deixei o tempo correr por mim, como o rio que corria, este apressado, debaixo dos meus pés.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

FIRENZE, DE NOVO


Florença fascina-me. É um local onde o respirar se faz de sonhos, onde o sonhar vive de saudades, onde as saudades são feitas de realidades passadas. A praça da Senhorinha, a ponte Vecchio, a Catedral, o mercado da palha, David sempre presente, mais as Galerias, os palácios, as vistas sobre o rio, os pequenos restaurantes, o bulício de vida e, claro, o melhor gelado do mundo... tudo deixa encanto, desperta recordações próximas, apazigua tempestades interiores.
Hei-de voltar, de novo, proximamente, para beber um pouco mais desta cidade de doçuras.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

É CARNAVAL! NINGUÉM LEVA A MAL!

A notícia saiu no dia de Carnaval e a malta do governo (com minúscula) e das cliques e claques políticas acham que, por ter saído neste dia, ninguém vai achar nem levar a mal.
Eles, claro, já foram a tudo o que é radio e televisão, dizer que é uma honra e o resultado de uma boa política internacional (executada pelo senhor Sócrates), a nomeação (acreditam que foi alguma eleição?) do nosso governador do Banco de Portugal (o senhor Vítor Constâncio), para vice-governador do Banco Central Europeu.
Diz ele que a vice presidência é "um cargo de grande exigência técnica, o que me cria um sentimento de grande responsabilidade". Pode ser que agora venha a ser responsabilizado pelas mais diversas falcatruas que se fizeram nos nossos bancos desde o Millenium BCP, onde o nosso vara da face oculta é vice-presidente, ao BPN e ao BPP, e que puseram em causa a supervisão do Banco de Portugal e do seu Chefe Máximo, esse tal de sr. Vítor Constâncio.
Acham que os depositantes desses bancos mal supervisionados pelo sr. Constâncio vão ficar satisfeitos? Acham que não vão levar a mal?
E o ordenadito que ele vai ganhar? Pouca coisa... Deve dar para ajudar a equilibrar as finanças de quem ficou sem nada nos bancos que ele não supervisionou (ou não lhe interessou supervisionar!). Com aquele ar de pessoa triste vai, de certeza, distribuir o dinheiro por quem mais necessita!
É o país que somos e os governantes que temos!
E se a malta toda deixasse de pagar impostos? (os tais que eles querem aumentar para pagar os ordenados e as reformas douradas deles?).
Não era uma guerra civil, mas seria uma boa movimentação civil...
Neste país já tudo cheira mal e, de certeza que não é por causa das bombinhas de mau cheiro (aquelas do Carnaval de antigamente, lembram-se?).

sábado, 13 de fevereiro de 2010

CORRIDA LENTA NUM CAMINHAR RÁPIDO

Corria lento no caminhar rápido que se propusera.

O dia tinha acordado soalheiro, pintalgado por uma ou outra mancha branca de nuvens a anunciar calor. Roupa leve, calçado cómodo e um chapéu branco para proteger do excesso de sol na cara e nos olhos. É que isto de olhos azuis e de pele clara não gostam muito da luz intensa. E o dia prometia!

O destino, naquele passo apressado, ficava a cerca de três quartos de hora. Resolveu dar uma folga de quinze minutos e, assim, ficava a dispor de uma hora, o que lhe dava margem para, no final do passeio, tomar uma bica amarga, mas cheia de sabor e aroma, na esplanada que fica defronte do atelier.

A pintura constituía, desde há mais de dois anos, uma forma de preencher o tempo que agora dispunha em abundância. Não que se considerasse um pintor, ou disso quisesse fazer modo de vida, mas sentia necessidade de expressar, em tela, as cores e os motivos que lhe preenchiam a cabeça. Descobrira aquele piso de janelas rasgadas sobre o mar. A luz era mais intensa da parte da tarde e o ocaso, sempre diferente e sempre ansiado, justificava a sua maior dedicação ao sol, à ondulação e ao mistério.

À medida que ia caminhando, o tal caminhar rápido, o seu pensamento ia voando de um lado para outro, deslocalizava-se, e se num momento vivia o ambiente que o rodeava: a rua, as casas, as pessoas com quem se cruzava, o barulho dos carros; no outro, sentia-se a passear na montanha, a subir encostas, a vaguear entre pinheiros, carvalhos, sobreiros e medronheiros; os cheiros da terra, os rumores do vento, os cantos dos pássaros e os ralos dos insectos enchiam-lhe a imaginação.

Como por magia, o passo rápido, o tal caminhar apressado da meta dos quarenta e cinco minutos com mais quinze para a bica, no passeio cimentado, liso e confortável ao caminhar, transformava-se num caminhar lento, o caminho tornava-se irregular, pedregoso por vezes, atapetado aqui e ali de folhas e ramos que convidavam a tropeçares e a um andar hesitante; o passeio desenhado a esquadro que acompanhava os prédios, que fazia ângulos retos nas esquinas desaparecia e deixava-se contornar por arbustos que foram crescendo ao dará dos ventos, das chuvas, dos tempos; o tempo deixou de ter tempo, as paragens nos semáforos para peões, nos atravessares de rua apressados, passaram a contemplações intemporais até onde o olhar alcançava; os ruídos dos veículos a motor eram sons de floresta; os cheiros da rua sublimavam-se em aromas campestres que o envolviam.

Tudo isto em flashes de alguns segundos, minutos(?) e, de novo, o regresso à realidade, aos pregões das peixeiras, agora que atravessava o mercado, ao colorido das bancas de legumes, aos verdes, aos amarelos e aos vermelhos, ao cheiro intenso da zona dos queijos, ao encontro com um conhecido, ao bom dia e ao como vai, que a circunstância exigia.

Faltava pouco, mais um tempo de nada, e o gaio a passar-lhe à frente, com um gralhar roufenho, abrindo as asas de um azul mesclado de tons de mel, atravessando a mata, sem hesitações, num zig-zag de gincana; o balido das ovelhas a pastar naquela baixa de terreno cheio de pasto bem verde; o latir longínquo dos cães de guarda da quinta na outra encosta da serra.

Nem se lembra se chegou ao atelier ou se bebeu a tal bica amarga cheia de sabor! A verdade é que as memórias dessa manhã ficaram nos latires dos cães que  ecoavam daquela encosta do outro lado da sua vida…

CLUBE DA LETRA


O Clube da Letra nasceu no dia 8 de Fevereiro de 2000, no Rio de Janeiro, pela mão de António Chibante e Francisco Amaral, ambos portugueses e residentes no Rio há já muitos anos. Cedo se juntaram António Basílio, Carlos Barata e Cecília de Castro. Desde então muita água passou nos ribeiros, muita gente que entrou e amigos que sairam, muitas mudanças de ambiente e de cenários aconteceram, mas fazendo com que o Clube da Letra fosse crescendo e amadurecendo. Sem dar por isso, o Clube da Letra está festejando o seu 10º aniversário. Para comemorar a década nada mais do que festejar da melhor maneira. Como diria Pessoa, se "a minha pátria é a língua portuguesa", vai de apagar as velas na terra do Portugal que pariu aquele Brasil imenso. E assim foi. Um grupo de elementos do Clube, onde pontificam António Chibante, Cecília Castro (a Presidente cessante), Aloysio Kelly (o actual Presidente), Marion Mac Dowell, Ângela Dutra de Meneses (a autora de "O Português Que Nos Pariu"), António Basílio Rodrigues, Marcos Jorge Gasparian, Ana Maria Kelly, Nãna Pirez, entre outras e outros veio em peregrinação a Portugal, passando pelo Porto, onde se encontraram com o António Ramalho de Almeida (membro correspondente no Porto) e festejaram, mesmo no dia 8, os 10 aninhos do Clube. Foi um motivo de dupla satisfação e comemoração para António Chibante, o pai do Clube, pelo facto de, também ser natural da cidade do Porto, mais propriamente da Ribeira. Depois de uma passagem por Coimbra e Óbidos, o grupo desceu à cidade de Fernando Pessoa e foi obsequiado com um magnífico almoço em casa de Pedro de Moura Reis (o bolinho da bacalhau e o arroz de pato à antiga portuguesa, assim como o vinho do Porto e o leite creme à sobremesa faziam parte da ementa) onde se estabeleceu um são convívio, se fez leitura, ou não fosse o Clube da Letra. Esta passagem por Portugal tem o seu epílogo esta noite de sábado, 13 de Fevereiro, com um jantar no Martinho da Arcada, o café e restaurante da preferência do Fernando Pessoa. O Martinho da Arcada, inaugurado em 1782 é um ícone da cidade e a referência ao poeta Fernando Pessoa. Da ementa farão parte o Caldo Verde e o Bacalhau à Martinho. Certamente que irá ser lida poesia, se irá celebrar a língua portuguesa e a confirmação de Raul Amaral Marques como membro correspondente do Clube da Letra em Lisboa.
Mais um episódio da vida do Clube. Muitos anos bons, de produção literária, de muita amizade e confraternização.

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

NOVOS E BONS SENTIRES

É verdade que vale a pena acreditar e confiar na vida e nas pessoas, mas nem sempre naquilo ou nas pessoas que julgávamos ser as certas para nós: quantas vezes, debaixo da capa da fidelidade não vamos descobrir traições (?), ou mentiras, apesar de cobertas por mantos de "verdades"? Quantos nós se vão atando ao longo da nossa vida, uns, pequenos e fáceis de resolver, outros mais complicados e complexos, aos quais não conseguimos descortinar as pontas? Quantas vezes não ficamos presos na vida simplesmente porque temos dificuldades em desatar um nó?
Mas, para tudo há uma solução: mesmo o Nó Górdio foi desfeito, de forma radical, a golpes de espada. A verdade, mesmo que doa, é que muitas vezes temos que entender que, na vida, há coisas e situações que têm de ser resolvidas assim: "d'un coup", como diria o meu amigo Jean Jacques.
Assim resolvidas, não deixam excrescências traiçoeiras, exigências disparatadas ou sentimentos desagradáveis que possam incomodar sentires novos e bons, permitindo a construção de um futuro mais risonho, mais esperançoso e, sobretudo, mais saudável.
A alma sente-se solta, o coração mais leve e a disponibilidade total.