A boneca chama-se Marafona da Santa Cruz e é natural de Monsanto, a aldeia mais Portuguesa de Portugal.
Não tem Bilhete de Identidade, nem Número de Identificação Fiscal (o vulgar número de contribuinte).
E nem sabe a felicidade que tem em não ter qualquer número.
Safa-se de pagar impostos, nem que estes sejam aumentados e, muito menos, livra-se de ficar sem o subsídio de férias ou o 13.º mês.
Que sorte!
Anatomicamente, a Marafona da Santa Cruz é uma boneca de trapos feita a partir de uma cruz. Tem esqueleto de madeira crucificada e corpo de pano.
Lembrei-me dela por dois motivos:
primeiro, porque estamos em Maio e ela simboliza a Deusa Maia, a deusa da fecundidade;
em segundo, porque em Maio é costume haver trovoadas e ela tem a virtude de afastar as ditas trovoadas.
Tem um porém, como dizem os irmãos brasileiros: não tem olhos, para não ver, e não tem boca, para não falar, se tem ouvidos ou não, para ouvir ou não ouvir, isso não sei; não me atrevo a tirar-lhe o lenço atado à cabeça. Mas é um porém que é, ao mesmo tempo, uma virtude: não vendo e não falando, não sei se ouvindo ou não, pode ser deitada na cama dos noivos na noite de núpcias para dar sorte. Deste modo os noivos têm uma noite cheia de sorte, sem haver os inconvenientes de serem vistos, comentados e, muito provavelmente, ouvidos pela nossa amiga Marafona.
A minha Marafona da Santa Cruz está sempre deitada na minha cama, só a tiro quando me vou deitar. Até hoje ainda não houve trovoada que incomodasse, só uma inundação. Mas isso não posso protestar junto dela. No livro de instruções que a acompanha, não fala lá nada de inundações.
Nem mesmo naquelas instruções que vêm no rodapé em letras muito pequenas.
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