sábado, 27 de novembro de 2010

O CAÇADOR

Tinha saído cedo... ainda noite... ia aos pássaros...

Já tinha aberto a época da caça... mas ele não ligava a isso... era anti-convenções, anti-regras, um caçador anarquista...

Saiu sorrateiro, com aquele andar manso, silencioso, felínico... passou por debaixo da sebe das piracantas, atravessou o caminho de terra batida, saltou agilmente o muro de pedra do vizinho e esgueirou-se, lesto, pelo meio da vinha já vindimada e ainda com algumas folhas de outono amarelo e vermelho e chegou ao outro lado...

Ali havia sempre água... um bebedouro quase natural, à saída da mina... agora era uma questão de esperar... quieto, quase imóvel... só com as orelhas atentas e um olho bem aberto...

O sol a começar a sorrir numa tangente ao horizonte... as cores a ganharem vida.... os trinados dos pássaros a acordarem o bosque de carvalhos, medronheiros e sobreiros... a água da mina a raiar lampejos de prata... como que a pedir... ser bebida...

Ele quieto... como um gato-estátua das Ramblas de Barcelona... só não tinha diante, a caixa das moedas...

Dois pardais, um chapim, um melro... ali, a banharem-se... a sacudirem as penas... a beberem... e ele quieto, as orelhas direccionadas, o olho aberto bem fixo no pardal mais gordo...

Um virar de cauda... uma desatenção... um salto de catapulta... quase instantâneo... certeiro... um estrebuchar... no final cuspiu as penas da cauda... foi só o que sobrou!

Agora penteia os bigodes... limpa o focinho... e prepara-se para um descanso... merecido... satisfeito... regalado!



(Foto tirada em Dezembro de 2008- Buenos Aires)


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