Ligou-lhe naquela noite.
O telefone avariado, fazia algum tempo, não lhe tinha permitido receber, nem fazer, qualquer telefonema.
Mas agora, com a ligação conectada de novo, com o sinal forte de chamar, pôde ouvir-lhe a voz, pôde escutar as novidades e as antiguidades, pôde saber da dona Mariquita, do filho do Martinez, das meninas do Cícero, das maldades da Diana, das conquistas do Amaral, do namoro do padre, enfim..., um pôr de histórias em dia desde o dia em que se avariaram, ao mesmo tempo, a televisão e o telefone.
A televisão foi de vez, disse o técnico - já não tinha arranjo - e agora espera a oportunidade de um anúncio onde encontre uma em condições, mas baratinha, que o dinheiro anda fugido e escorregadio.
Agora com o telefone, a conversa foi outra: avisou a Companhia, explicou o que era, e ficou a aguardar que lhe estabelecessem a comunicação.
Demoraram, mesmo assim, duas semanas a restabelecer a ligação. Uma questão de cabos danificados que tiveram de ser substituídos.
Agora quase tudo voltara à normalidade, tudo menos a televisão!
Não que lhe fizesse falta por causa das notícias, são quase sempre más, nem dos programas da Júlia ou da Fátima, nunca vê, nem sequer do concurso daquele gordo vestido de preto; o que lhe falta, o que realmente lhe seca a alma é não saber se a Diana mata a Inês, se a Sandra fica com o Orlando, se o Fred se casa com Janaína ou se Solano morre com a maldição...
Mas, do mal o menos, apesar de não ter a televisão, a verdade é que sempre pode ir fazendo um telefonema para saber das novidades e para fazer um pouco mais de prosa, lá da Quinta, longe da civilização.
1 comentário:
É incrível a forma como num instante nos tornamos dependentes das tecnologias.
Beijos
Berta
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