Passava o tempo a queixar-se, a falar das suas emoções, dos seus sentires - dizia ela -, dos seus problemas, do trabalho, do escritório onde gastava as horas e os dias da sua vida, do chefe intolerante e intolerável, dos colegas e, principalmente, das colegas.
Queixava-se porque não aguentava o "stress", queixava-se porque o dinheiro era escasso, queixava-se porque os filhos estavam numa idade má, queixava-se porque o marido andava com problemas no trabalho, queixava-se porque atrás dos problemas do marido vinha o álcool que ele consumia em excesso e as agressões verbais que nunca passaram disso, felizmente, nunca lhe tinha batido.
Queixava-se porque andava infeliz, porque o trabalho em casa era muito, sem empregada doméstica porque, se a tivesse, lá ia o dinheiro do salário para os bolsos da empregada, e era o fazer a comida, o lavar a roupa, o passar a ferro, o limpar a casa e fazer as camas... não tinha descanso.
Queixava-se porque lhe doíam as costas, porque tinha dores de cabeça, porque já andava a ver mal e não tinha tempo para ir ao oftalmologista, porque, achava, estava a entrar na menopausa e a começar a sentir uns calores, a variarem os humores, o cabelo a cair em demasia.
Queixava-se porque os pais estavam doentes e ainda tinha de ir lá a casa ajudá-los ao fim de semana, porque durante a semana não encontrava tempo para ir vê-los.
Queixava-se porque a vida não lhe tinha sorrido como gostaria.
Mas, quando soube das medidas de austeridade que o governo socialista vai implementar, quando soube o quanto lhe vão ao bolso, o quanto a vida vai ser mais difícil, o quanto vai ter que pagar mais pela vida, o quanto o viver lhe vai doer no dia a dia, então sentiu que as queixas de que se queixava não passavam de um mero queixume.
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