O almoço era excelente, o local não podia ser mais maravilhoso, a vista da janela perdia-se na imensidão daquele mar azul forte, bem tingido... quase apetecia mergulhar o aparo da caneta com que anoto os meus apontamentos e escrever com aquela tinta azul, bem salgada. De certeza que a escrita ia ganhar outro sabor, mas esta mania das medicinas refreou-me um pouco o entusiasmo porque associei, de imediato, o sal ao aumento da pressão arterial.
De qualquer modo vinguei-me durante a refeição: uma sopa cremosa com calabresa, aquela linguiça fatiada e bem salgada, a fumegar e a fazer-me lembrar a canja de galinha em Tormes ("desconfiado - Jacinto - provou o caldo que era de galinha e rescendia. Provou... e levantou uns olhos que brilhavam, surpreendidos." - Eça de Queiroz in A Cidade e as Serras); depois, e porque a vizinhança daquele mar tranquilo exigia um prato a condizer fui surpreendido por um Strogonoff de arangosta (lavagante) com risoto de trufas negras, de sabor e apresentação espectaculares e acompanhado de um vinho branco soberbo, um Lacrima Christi de 2008, na boa temperatura - um vinho dourado que deixa um adeus inesquecível; finalmente um Zabaglione com frutos vermelhos temperado com um Marsalla seco para cortar o doce deste fim de refeição.
Não sei se o fígado protestou, se a pressão arterial subiu, se os diabetes açucararam o meu sangue ou se o colesterol me besuntou, ainda mais, as minhas coronárias. Também não notei que o Lacrima Christi ou o Marsalla me tivessem perturbado o espírito.
Apenas sei dizer que senti uma onda de prazeres a invadir o meu sossego naquele começo de tarde em que me fui despedir daquele lugar.
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