quarta-feira, 31 de outubro de 2012

CARNE VIVA




Ficam assim, em carne viva, os troncos destas árvores nobres e nacionais.
 
Faz parte do seu ritual de vida!
 
Cada nove anos chegam os homens e, como num cerimonial cirúrgico, vão dispondo os instrumentos de corte, encostando os escadotes ao tronco, calçando luvas de pele, colocando os capacetes de protecção e, às ordens do responsável, começam a cortar, selectivamente, a cortiça daqueles troncos erectos, imponentes, senhoriais!
 
Tiram-lhes a casca - a cortiça -, um dos materiais mais nobres da natureza arborícola, e as árvores vão ficando despidas, de tronco sangrante, em carne viva. 
 
Ao olhar as árvores, assim nuas, despidas da sua cortiça, com o tronco da cor do sangue vivo, lembrou-se do país, da governação, da troyka, dos políticos que, cada dia, vão arrancando a pele às pessoas, delapidando os contribuintes, numa atitude cirúrgica, bem escalpelizada e radical, deixando as feridas, bem à mostra, como carne viva, não perdoando nem um bocadinho de pele para se fazer qualquer enxerto.
 
Os sobreiros, esses, vão regenerando nova pele, cortiça nova, fresca e de boa qualidade. Isto porque os homens, os que sabem tratar das árvores, apenas lhes tiram parte da casca,  para não a matarem, nem mexem nas raízes, não alterando a seiva e, por isso, apesar de ficarem com o tronco em carne viva, os sobreiros recuperam rápido...
 
Mas os outros homens, os da economia, das finanças, da governação e da política arrancam-nos a pele quase toda, cortam-nos os alimentos do corpo e da alma, roubam-nos a esperança, aquilo que ainda resta da seiva que nos alimenta, considerando-nos como árvores condenadas, árvores das quais aproveitarão até a sombra, enquanto tiverem folhas.

Mas este povo lusitano, como estes sobreiros nobres e lusos, nunca se irá vergar a esta gente e, se tiver que morrer, será de pé, como as árvores!
 


(DO AUTOR - NA SERRA DE SÃO MAMEDE - SOBREIROS ACABADOS DE SEREM DESCORTIÇADOS)






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1 comentário:

Anónimo disse...

Grande verdade!!!

Ana Gamas