No meio da sua escoliose bem torcida, das sequelas da sua tuberculose curada em sanatórios, da sua bronquite crónica e do enfisema, da sua hipertensão arterial, da gastrite e da colite e, ainda, dum reumatismo tramado que lhe tem tolhido os movimentos das mãos e do andar, tem sabido resistir à vida.
Mas, a verdade é que, neste último ano, a doença tem vindo a dar cabo dela, tem-na atravessado de forma tão assanhada e tão marcada: é a falta de ar com o cansaço, são as palpitações, as infecções urinárias repetidas, a azia que lhe sobe até à boca, a tosse com farfalheira, a expectoração abundante e de cor não recomendável... Febre, isso não, nunca teve! Nem no tempo do sanatório! Nunca fui mulher de febres, diz!
E, o pior é que, ultimamente, já não é capaz de tomar conta da sua vida sozinha. Já só vem às consultas acompanhada com uma das filhas, que lhe vão carregando os sacos dos exames e dos remédios, e a ajudam a tirar o casaco e as camisolas com que se encebola em demasia, por causa do frio deste inverno.
Mas hoje, não!, apareceu-me sorridente, bem disposta, a contar histórias de África, da sanzala, da visita de um leão esfomeado, das pacaças trazidas pelo pai quando ia à caça, do sol diferente, dos dias longos e da paisagem sem fim... Desde há uns dias que se libertou da tosse que parece, mesmo, ter ido embora, da canseira que já quase não existe, da tensão que normalizou, das dores que atenuaram, da angústia de viver que, quase, desapareceu...
E não se conteve, não quis calar a sua alegria, a felicidade que sentia, a satisfação imensa de ser bisavó dum bisneto que lhe nasceu há dias, o seu último desejo de vida... Ter a felicidade de ver um bisneto!
Olhe lá doutor, e será que a felicidade cura? Perguntou ela...
1 comentário:
Eu acredito que sim, a felicidade cura. E a infelicidade, mata!!
Beijos
Berta
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