Pegou nas três caixas de tamanhos diferentes e dispô-las no recanto da parede colocando a maior atrás e as outras duas, mais pequenas, adiante, como se fossem degraus. Depois, espalhou o velho saco de serapilheira, que previamente tinha cortado dos lados, por cima das caixas, de modo a sugerir a encosta de um monte. Aconchegou com as mãos os socalcos, levantou o tecido num ou noutro local e, no meio daquele cenário ainda em bruto, colocou, no local mais em evidência, a cabana a servir de presépio.
Junto a si tinha um pequeno balde com areia, dois sacos de supermercado cheios de musgo bem verde, que tinha ido colher de manhã no muro velho da quinta, as figuras em barro pintado das pessoas e animais, as casinhas, o espelho redondo, a farinha branca, meia dúzia de ramos de cedro, o sistema de luz e, bem dourada, a estrela cadente ou cometa, que irá indicar, aos réis Magos, o caminho de Belém.
Não ia ser tarefa rápida, já sabia como era, com tantas figuras, tantos pastores, campesinos, ovelhas, o burro e a vaca (sim!, no presépio dele o burro e a vaca estariam presentes), os réis Magos com os seus camelos e as três figuras principais do presépio: o São José com o bordão florido, a Nossa Senhora de rosto sereno, contemplativo e o Menino, deitado num berço de palhas, sorridente, de perna esquerda flectida...
Todos os anos montava o Presépio de maneira diferente mas havia sempre, em comum, a areia a desenhar as estradas e os carreiros, o espelho a servir de lago com os patinhos a nadarem na sua superfície, os ramos de cedros a fazerem de árvores, a farinha a cobrir os cumes dos montes e os telhados das casas, como se tivesse havido um nevão, a luz branca, como um foco, para iluminar o Menino e, presa por um fio de nylon, esticado e fixado nos recantos da parede com fita-cola da invisível, a estrela a apontar o local do nascimento do Jesus Menino.
Mas, a parte de que mais gostava era logo a primeira, a da colocação do musgo que ia atapetando toda aquela serapilheira disposta em socalcos irregulares. Era o musgo que dava a forma ao morro descendente, conferindo textura e vida àquela estrutura, a cor verde ia variando do mais claro ao mais escuro e, numa ou noutra porção daquele musgo húmido, uma flor tímida ou um cogumelo selvagem, mantinham-se, ainda, cheios de vida. De tempos a tempos borrifava o musgo para que não secasse até à chegada do dia de Natal...
Neste seu Natal não havia lugar para pinheiros, luzinhas a piscar ao ritmo de canções de Natal, nem bolas vermelhas ou douradas, nem renas, nem trenós, nem o HOW HOW HOW cavernoso e assustador do velho Pai Natal da Lapónia...
Bastava-lhe este seu presépio, feito com carinho, amor e muito musgo, com as figurinhas tradicionais, muitas delas trazidas da casa dos avós, para lhe encher a casa do genuíno espírito do NATAL!
(DO AUTOR - O MUSGO NUM MURO VELHO DA QUINTA DA PROSA) |
.
7 comentários:
Bonito isso.
Marion Mac Dowell.
Gosto como sempre muito.
Maria De Lourdes Silva
Lindo conto de Natal!
Meus votos de paz e alegrias!
Sua amiga Vera
Esse é o verdadeiro espírito de Natal... Gostei, Dr.
Luísa Romão
Fiquei com vontade de fazer um presépio...
Sãozinha Mello
É este o genuíno Presépio, feito com o sentimento brotado do coração, sem os enfeites desnecessários, próprios da época em que vivemos... Parabéns pelo seu lindo PRESÉPIO.
Maria Luísa Silva
Adorei!... Lembrou-me tanta coisa simples e tão mágica e encantadora ligada ao verdadeiro espírito da época... o musgo que o meu avô trazia e que nunca faltava.... ainda hoje me cheira e é tão bom!
Obrigada pela partilha!
:)
Joana Menano
Enviar um comentário