A casa, no centro da cidade, está abandonada... as janelas, entreabertas, com os vidros partidos, são o local preferido para estes encontros vespertinos.
Vão chegando, uma a uma, escolhem o melhor poiso e ali ficam arrulhando como conversas de vizinhas à janela...
Não sabe muito bem como mas, naquele momento, vieram-lhe à lembrança as primeiras estrofes das "Vozes dos Animais", de Pedro Dinis, do seu livro da 3.ª Classe e que, tão bem, sabia de cor...
E cacareja a galinha,
Os ternos pombos arrulham,
Geme a rola inocentinha.
Muge a vaca, berra o touro
Grasna a rã, ruge o leão,
O gato mia, uiva o lobo
Também uiva e ladra o cão.
Relincha o nobre cavalo
Os elefantes dão urros,
A tímida ovelha bala,
Zurrar é próprio dos burros.
Regouga a sagaz raposa,
Brutinho muito matreiro;
Nos ramos cantam as aves;
Mas pia o mocho agoureiro.
Sabem as aves ligeiras
O canto seu variar:
Fazem gorjeios às vezes,
Às vezes põem-se a chilrar.
O pardal, daninho aos campos,
Não aprendeu a cantar;
Como os ratos e as doninhas,
Apenas sabe chiar.
O negro corvo crocita,
Zune o mosquito enfadonho,
A serpente no deserto
Solta assobio medonho.
Chia a lebre, grasna o pato,
Ouvem-se os porcos grunhir,
Libando o suco das flores,
Costuma a abelha zumbir.
Bramam os tigres, as onças,
Pia, pia o pintainho,
Cucurica e canta o galo,
Late e gane o cachorrinho.
A vitelinha dá berros,
O cordeirinho balidos,
O macaquinho dá guinchos,
A criancinha vagidos.
A fala foi dada ao homem,
Rei dos outros animais:
Nos versos lidos acima
Se encontram em pobre rima
As vozes dos principais.
(DO AUTOR - HORA DA PROSA FEITA DE ARRULHARES AO BALCÃO - ANGRA DO HEROÍSMO) |
1 comentário:
Que linda imagem!
Maria João Falcão
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