sexta-feira, 31 de agosto de 2012

GARCIOSIDADE

Chegou assim que a maré começou a baixar.

Veio, num voo planado, chegou com um bater curto de asas, elegante e gracioso, e, delicadamente, deixou que as patas tocassem e se enterrassem levemente naquele lodo mole, saltitando depois, até sentir que não enterrava as patas, mais do que o pretendido.

Ficou quieta durante uns momentos, quase como uma estátua e, assim que à sua volta tudo voltou à normalidade - os caranguejos saíram das tocas, as ameijoas à superfície começaram com os seus esguichos, os peixes aprisionados nas poças de água voltaram às suas voltas... -, lentamente, com gestos cuidados e estudados, olhando aquele lodo em efervescência, começou na sua luta pela vida.

Com o seu olhar de garça, a fixar a vítima, o pescoço a mover-se lentamente, como se fosse o meneio de um bailado, o bico, semi-aberto, a aproximar-se e, num instante, a refeição estava ganha.

Repetiu os gestos, movimentando-se com a lentidão que a situação ia exigindo mas, num ápice, lá ia mais um peixe, uma conquilha, um caranguejo, um molusco sem carapaça... bicados por aquele rostro comprido e bem afiado... 



(DO AUTOR - GARÇA DA RIA - FUSETA - ALGARVE)

E, assim que o sol se pôs, assim que o dia começou a adormecer e a luz a tornar-se escassa, com a sua graciosidade de garça - numa espécie de garciosidade - partiu, batendo as asas em silêncio e suavemente, elevando-se nos ares iluminados, agora, por um luar de quase lua cheia...



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quinta-feira, 30 de agosto de 2012

ALEM-TEJANA

Juro!

Era assim que estava escrito: o nome de uma embarcação!

Provavelmente a lembrar uma alentejana que partiu para o Além!

Fica o registo!

(DO AUTOR - NA ILHA DA TERRA ESTREITA, JUNTO A SANTA LUZIA - ALGARVE)

quarta-feira, 29 de agosto de 2012

A ILHA DA CULATRA

Desta vez passou por cima dela!

Não andou a seu lado, não a atravessou, nem lhe pisou a terra e, muito menos, se sentou na areia macia, quase branca, que se deixa enterrar, ou mergulhou naquela água azul transparente e quase quente!

Também não lhe viu o nascer ou o pôr do sol, nem se encantou com a lua mole, quase a ficar cheia!

Desta vez passou-lhe por cima... num voo da Ryanair!

(DO AUTOR - A ILHA DA CULATRA VISTA DO LUGAR 5A A BORDO DE UM AVIÃO DA RYANAIR)






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terça-feira, 28 de agosto de 2012

NO MEU PAÍS O CÉU É AZUL



(DO AUTOR - O CÉU NA ILHA DA CULATRA - ALGARVE)



"O meu país sabe as amoras bravas 
no verão.
Ninguém ignora que não é grande,
nem inteligente, nem elegante o meu país,
mas tem esta voz doce
de quem acorda cedo para cantar nas silvas.
Raramente falei do meu país, talvez
nem goste dele, mas quando um amigo 
me traz amoras bravas
os seus muros parecem-me brancos,
reparo que também no meu país o céu é azul."

Sophia de Mello Breyner Andresen - AS AMORAS

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

FOLHA SECA

Em memória...

(DO AUTOR - FOLHA SECA -QUINTA DA PROSA - SÃO BENTO - SERRA DE SÃO MAMEDE)

"Perdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi.

De que serviu tecer flores
pelas areias do chão,
se havia gente dormindo
sobre o próprio coração?

E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.
Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando àqueles
que não se levantarão...

Tu és folha de outono
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
Certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão..."

Cecília Meireles - Canção de Outono.




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domingo, 26 de agosto de 2012

DEBICADO

Este ano, a velha figueira foi pouco pródiga em figos!

O habitual era começar a dá-los pelo São João e, até Setembro, era sempre um fartote!

Esta ano não! Os gomos dos frutos foram poucos, cresceram mais devagar e, muitos, caíram com as chuvas de Maio, com os ventos fortes de suão e com o temporal de granizo que desabou numa tarde de Abril!

Apesar de tudo a velha árvore, aparentemente, continuava no seu vigor, com os braços apoiados, é certo, como se usasse muletas, a imitar o plátano no centro da cidade! Uma figueira quase centenária!

Mas este ano... sinais dos tempos?... da força do clima?... ou da velhice?... não deu nada, ou melhor, não deu quase nada! Os poucos frutos que amadureceram não se podiam comparar com os dos outros anos: mais pequenos, menos cheirosos, menos atraentes, de pele mais espessa, incapazes de se abrirem numa oferta de tentação!

Porque lhe despertou mais a atenção, foi acompanhando o crescimento de um figo em especial, mais cheio que os outros, de aspecto suculento e, por isso, foi-o  mantendo, sempre, debaixo de olho, deixando que se açucarasse, que engordasse e amadurecesse um pouco mais, até a pele ficar bem escura, quase a estalar de cheia... 

E, naquele dia, quando o foi colher para o pequeno-almoço, ainda a manhã estava fresca e o sol já espreitava por entre os galhos e as folhas,  ficou surpreendido! Um melro luzidio, de bico bem amarelo, estava a acabar a sua primeira refeição, a refastelar-se de gulodice, depois de ter cortado, com precisão, a capa já mole do figo e ter debicado o seu interior doce e melado que ele se preparava para saborear!


(DO AUTOR - DA FIGUEIRA)


A verdade é que, naquela manhã, o pão com manteiga e o café forte não lhe souberam ao mesmo!

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sábado, 25 de agosto de 2012

DANS CHAQUE COEUR...

(DO AUTOR - CULATRA - ALGARVE)


Dans chaque coeur un navire à l'ancre sommeille...



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sexta-feira, 24 de agosto de 2012

SURF

Era uma gaivota sabida, não muito velha, mas esperta como nenhuma! 

Voava como as outras, comia, como as outras, o peixe e os restos dos caixotes do lixo quando o peixe não abundava, adorava um dia de vento e tinha uma predilecção especial por um bom mar encrespado... Tudo, tal e qual, como as outras!

Mas tinha uma virtude que a tornava diferente das tais outras: é que gostava de observar o que se passava à sua volta, de ver como os homens se deslocavam no seu caminhar oscilante, de uma perna para outra, daí o andar gingão que foi adquirindo, de como flutuavam e nadavam, mesmo sem terem penas ou membranas entre os dedos e, mesmo, como voavam, sem possuírem asas próprias... Notou como os homens a imitavam com aquelas barbatanas enormes que eles, os homens, punham nos pés, ou como voavam, tentando copiá-la, dentro de enormes pássaros metálicos de asas enormes e quietas, que pareciam planar nos céus, mas fazendo um barulho imenso que a perturbavam no seu sossego.

As suas observações dos homens foram-na tornando, cada dia, mais curiosa... Reparou que eles iam beber muito da natureza para melhor se adaptarem ao seu dia a dia: já voavam quase como ela, por longas distâncias, mergulhavam nas águas, é certo que com aqueles fatos, óculos, tubos na boca e as tais barbatanas, olhavam através de binóculos para verem ao longe, quase tanto como ela, enfim!!! num imitar, quantas vezes grosseiro, do que ela e o resto da natureza faziam.

E como era esperta e curiosa, cedo começou a imitar os homens naquilo que ela, por hábito, não fazia. 

E assim foi que, encontrando uma tábua que lhe servia de prancha, se especializou em deslizar sobre as águas, aproveitando a corrente da ria, as ondas da maré, a força do vento e, quando tudo estava tranquilo e a superfície da água quase um espelho, lá ia dando um bater suave de asas para surfar, deliciada, como via os homens a fazer ali, a seu lado, mas puxados por barcos, ou sendo levados pela força dos ventos ou pelo tubo das ondas...

E, quando alguma coisa se complicava e a prancha saltava ou se virava, por força de uma onda onda mais revoltosa, bastava uma batida mais forte, nas asas já abertas, e lá ia ela pelas alturas, ao mesmo tempo que olhava para baixo a rir-se dos homens, a esbracejarem, aflitos, naquelas águas mais agitadas...

Daí ser conhecida, pelas outras, como a gaivota de imitação!

Mas ela sentia-se, isso sim, cheia do seu orgulho, e considerava-se, antes, uma gaivota de estimação!


(DO AUTOR - GAIVOTA A SURFAR NAS ONDAS DO MAR - CULATRA - ALGARVE)


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quinta-feira, 23 de agosto de 2012

NOVO DIA

(DO AUTOR - NA CULATRA - ALGARVE)



Foi assim que o dia acordou!

Silencioso, pacífico, solitário, com o céu cinzento rosado riscado de amarelos de oiro, e com o laranja do sol a aparecer como uma meia bola que, a pouco e pouco, se foi enchendo, como a maré, e iluminando o mundo até atingir o seu resplendor!

Surgiu na hora exacta, na mesma hora em que os barcos pequenos, de pescadores solitários, se dirigiam ao mar à procura do sustento, a mesma em que as aves, se elevando no céu, partiam, também, à procura do alimento, repetindo o ciclo de cada dia.

Um ciclo em que a lua, as marés e o vento, comandados pela batuta do sol, vão condicionando a nossa vida...

Hoje, foi assim!
    
Amanhã, como será?




quarta-feira, 22 de agosto de 2012

NOITE

(DO AUTOR - A LUA ESTA NOITE)
"Noite de folha em folha murmurada,
Branca de mil silêncios, negros astros,
Com desertos de sombra e luar, dança
Imperceptível em gestos quietos".

Sophia de Mello Breyner Andresen, in Poemas Escolhidos - Noite.




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terça-feira, 21 de agosto de 2012

MAIS OLHOS QUE BARRIGA

Apareceu subrepticiamente, em silêncio quase total, rastejante na sua condição, de olhar fixo, sem pestanejar, hipnotizante...

Deixou-se ficar, como pendurada, na beira do tanque, de boca aberta, parada, à espera que o peixe vermelho, que de quando em vez vinha à superfície apanhar um insecto voador, saltasse o suficiente para o abocanhar. De tempos a tempos soltava a língua bífida, abanando-a a imitar o tal insecto, iludindo-o.

Nem teve tempo de reagir... Mal ele pôs a cabeça de fora escancarou ainda mais a boca e, no instante daquele momento, prendeu-o com os dentes e começou no lento processo da deglutição. Ainda assim foi sol de alguma dura, o peixe era maior do que a boca e não havia maneira de o engolir... Ali estiveram os dois um bom tempo, numa boa luta pela sobrevivência: o peixe a debater-se a tentar safar-se da morte e a cobra a abrir, cada vez mais, a boca a tentar garantir o alimento que lhe dava a subsistência...

E foi, no disparo mais ruidoso de uma fotografia que o réptil se assustou e, abrindo ainda mais a boca, largou o peixe que, calmamente, voltou às águas do tanque onde nascera...

(DO AUTOR - QUINTA DA PROSA - SÃO BENTO - SERRA DE SÃO MAMEDE)

  

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

HÁ MUITO


(DO AUTOR - PRAIA DE MOLEDO - MINHO)
"Há muito que deixei aquela praia
De grandes areais e grandes vagas
Mas sou eu ainda quem na brisa respira
E é por mim que espera cintilando a maré vaza".

Sophia de Mello Breyner Andresen, in Obra Poética - Dual.

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domingo, 19 de agosto de 2012

PONTARIA

Ainda tinha lá em casa a fisga feita com a bifurcação de um ramo de árvore, com elásticos de borracha de uma velha câmara de ar e uma funda de sola, bem ensebada pelos dedos da tanta utilização que lhe dera.

Era hábil com a fisga e tinha boa pontaria: tivesse a pedra adequada - e andava sempre com uma boa reserva nos bolsos - e nada falhava, fosse o que fosse que surgisse ao seu alcance e ficasse sob a sua mira. Quando via um passarito num galho, uma lagartixa numa parede, uma cobra à sua frente parava, tirava a fisga que andava sempre à cintura, escolhia, pelo tacto, a pedra mais adequada, passava-a pelos lábios, como que a beijá-la, colocava-a na funda e, sem grandes delongas, mas com estilo, atirava certeiro. Se era o pobre de um pássaro, lá o colocava à cintura, como um troféu de caça, e levava-o para casa juntando-o, aos que foi matando, para uma fritada.

Deixara-a, guardada, na arca de madeira onde ia colocando todos os brinquedos e objectos que ia deixando de usar. Um mundo de recordações, uma mostra de como a sua vida foi crescendo, os brinquedos mudando e evoluindo, as escolhas modificando.

Sempre fora um perfeccionista: quer na caligrafia, com a letra bonita e bem desenhada, no desenho, tentando aprimorar os detalhes, nos estudos, sempre atento, a não perder pitada do que ouvia nas aulas e depois estudando em casa, como na profissão que escolhera e abraçara, procurando os pormenores, ouvindo com interesse e observando com meticulosidade...

Também, no desporto procurou uma modalidade exigente em precisão, de mão firme, olho arguto e determinação. E, como a mania e habilidade com a fisga lhe estavam na massa do sangue, escolheu o tiro ao arco.

(DO AUTOR - CASA DAS MUDAS - EXPOSIÇÃO ARTE MODERNA DE JOE BERARDO - ILHA DA MADEIRA)


Agora, com o filho a seu lado, ensina-lhe o modo correcto de pegar no arco, a importância do braço bem esticado e horizontalizado, o olho bem orientado e focado no alvo, a corda bem retesada, a ponta do indicador e do polegar a pegarem, de forma quase subtil, mas firme, a ponta da flecha até ao momento do disparo. 

A pontaria certeira e a maçã a abrir-se em dois pedaços, mesmo ao meio, como a maçã do Guilherme Tell, no dia em que este teve de a acertar sobre a cabeça do filho!


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sábado, 18 de agosto de 2012

TOURADA

Andam para aí uma série de movimentos contra as Touradas.

Até há Câmaras Municipais que, de uma forma draconiana, proibem as touradas, sem mais quê!, sem consultas ao povo, esquecendo-se que as touradas são um espectáculo popular e do mais tradicional que existe no nosso país!

As touradas são uma forma de expressão cultural deste povo luso. Um povo que ama os seus animais, que dignifica o touro e enobrece o cavalo.

As touradas não são mais do que uma representação onde, na arena, são postos frente a frente, o touro, o homem e o cavalo. São um espectáculo de cor, de musicalidade, de ritmo, cheio de coreografia, de virtuosismo, de sensação e de coragem! 

Quem fica indiferente ao bailado  de um cavalo frente a um touro possante? Ou à dança de um toureiro com a muleta tentando iludir o animal? Ou à graciosidade de um bandarilheiro na preparação e no momento da reunião? Ou à coragem e assomo de um forcado olhando e pegando, de caras, aquela força da natureza? 

Quem não gosta de beleza e riqueza da casaca de um cavaleiro, ou de um "traje de luces" de um toureiro ou de um bandarilheiro, ou fica indiferente à simplicidade e garridice do traje de um campino, ou de um forcado?

Os toiros, os cavalos, os toureiros, os cavaleiros, as praças de touros fazem girar,  à sua volta, um sem número de pessoas, de profissionais, de famílias, de tradições, de culturas...

As touradas, além do mais, são uma atracção turística e um emblema de muitas localidades e regiões!

(DO AUTOR - PRAÇA DE TOUROS DE ARRONCHES)


Há música mais genuína que a das bandas e filarmónicas que animam uma tourada? 

E as touradas à corda tão típicas dos Açores, em particular na Ilha Terceira? Só quem não as viveu não sabe o quão emocionantes e divertidas são...

As touradas, certamente, não vão acabar!






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sexta-feira, 17 de agosto de 2012

LONDRES

Agora, com os Jogos Olímpicos acabados, com o fim do torvelinho e da agitação dos dias gloriosos, das vitórias, dos recordes, das medalhas, dos aplausos, das multidões sorridentes, das bandeirinhas, dos festejos... Londres parece respirar um descanso merecido.

A cidade ganhou uma calma e descanso merecidos, quase se deixando adormecer na quietude das tardes quentes destes dias de verão, como fazendo uma sesta alentejana....



(DO AUTOR - O BIG-BEN VISTO DE UMA DAS CÁPSULAS DO LONDON EYE)


A merecer mais uma visita, depois dos Jogos, esta cidade limpa, colorida, rejubilante e gloriosa!


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quinta-feira, 16 de agosto de 2012

DEPUTADO

O deputado é um eleito!

Ganha bem, tem subsídios para tudo, privilégios que mais ninguém tem, vive bem e reforma-se melhor!

O deputado é eleito, não pelo voto directo do povo, mas através de listas feitas pelos partidos! Grande parte deles não conhece os eleitores do ciclo por onde foram eleitos e não responde perante os seus eleitores, mas directamente ao directório do partido.

A maior parte deles não abre a boca, nem tem ideias próprias, mas apenas expressa as do partido que o elegeu através das listas.

Tem muitas benesses, muitos subsídios, muitos privilégios... tantos, tantos... Mas é natural, eles é que fazem as leis e, quem parte e reparte (deputado) e não tira a melhor parte... ou é tolo (honesto) ou não tem arte (inteligência)!

Até se conta a história que Deus resolveu, um dia, dar dois atributos aos habitantes de cada país: honesto, trabalhador, inteligente, persistente, político, sabedor, estudioso, sedutor... Ao português atribuiu, por engano (Deus que nunca se engana!), três qualidades: inteligente, honesto e político! Ora, os Anjos que O acompanhavam chamaram-Lhe a atenção para o descuido, que já não podia ser reparado, que punha em vantagem o português em relação aos outros. Como Deus é, também, infinitamente Justo e Sabedor emendou o engano da seguinte forma: só poderia ter dois daqueles atributos ao mesmo tempo e nunca os três juntos; assim, se o português for inteligente e honesto, não pode ser político, se for inteligente e político, não pode ser honesto, se for honesto e político, não pode ser inteligente!

A última das benesses, dos privilégios, para além de se poderem reformar ao fim de 8 anos de legislatura e terem muitas reformas acumuladas e vitalícias, foi a de eles poderem obter, super-rapidamente, as suas reformas.

Esta notícia, do Jornal "i", ilustra bem o que é o pobre deste país em que o podre e o poder se escrevem com as mesmas letras:

"O "jornal i" escreve que afinal há portugueses de primeira e portugueses de segunda. Numa altura em que a Caixa Geral de Aposentações está a levar mais de um ano a despachar as reformas, há um pequeno grupo de políticos que teve as suas reformas despachadas em menos de um mês.
Por exemplo, Jaime Gama, antigo presidente da Assembleia da República, enviou para a CGA o requerimento da sua pensão a 9 de Maio de 2011 e foi despachada a 20 de Junho do mesmo ano.
Maria do Rosário Boléo requereu a reforma a 11 de Outubro de 2010 e viu-a ser despachada a 29 do mês seguinte, Teresa Xardoné, entrou com o pedido a 14 de Agosto de 2009 e viu ser-lhe atribuída a aposentação a 18 de Novembro do mesmo ano, ou Jorge Strecht Ribeiro, que entrou com os papéis a 25 de Maio de 2011 e foi reformado a 15 de Setembro de 2011, são alguns dos exemplos, entre muitos outros, de deputados que conseguiram ver despachados os seus pedidos de reforma em menos de um mês."


Mais palavras para quê? São políticos p o r t u g u e s e s!

Nota: pus a letra, assim pequenina, apenas por VERGONHA!

(DO AUTOR - A BORDO DE UM BARCO DE PASSAGEIROS PORTUGUÊS)



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quarta-feira, 15 de agosto de 2012

MARIA

(DO AUTOR - IMACULADA CONCEIÇÃO - MADALENA DO PICO - AÇORES)


Hoje comemora-se a Assunção, aos céus, de Nossa Senhora.

Um dia Santo e feriado que, por força da crise e da troyka, vai deixar de ser feriado mas, a santidade ninguém lha tira! As solenidades irão passar, certamente, para o domingo a seguir, para que o dia não passe esquecido

Celebra-se, assim, o nome e a pessoa de Maria, a Mãe de Cristo, a Mulher...

Muitas comunidades estarão em festa, principalmente as ligadas às actividades da pesca porque, também hoje, é o dia da Senhora dos Navegantes!

Uma tradição tão antiga como a dos descobrimentos portugueses!

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terça-feira, 14 de agosto de 2012

ROUBO

(DO AUTOR - ASTÚRIAS)

"Quem me roubou o tempo que era um
quem me roubou o tempo que era meu
o tempo todo inteiro que sorria
onde o meu Eu foi mais limpo e verdadeiro
e onde por si mesmo o poema se escrevia"


Sophia de Mello Breyner Andressen - Poemas dispersos, in Obra Poética em Setembro de 2001.




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segunda-feira, 13 de agosto de 2012

PRAIA VAZIA

Quase nem se deu conta que a tarde anoitecia, e só quando reparou que era a lua crescente, com a sua luz tranquila e fria, que iluminava a praia, agora vazia, e que ia deixando o rasto de um ténue brilho no mar que, com o escurecer, também se amolecia, é que viu que terminara o dia...

Pegou então na máquina, ajustou a sensibilidade, regulou a abertura, fixou o tripé e, numa explosão de luz de um flash cheio de energia, fez a boa da fotografia!



(DO AUTOR - PRAIA VERDE - ALGARVE)

domingo, 12 de agosto de 2012

PAISAGEM


(DO AUTOR - ALGARVE AO FIM DO DIA)




"Passavam pelo ar aves repentinas,
O cheiro da terra era fundo e amargo,
E ao longe as cavalgadas do mar largo
Sacudiam na areia as suas crinas.

Era o céu azul, o campo verde, a terra escura,
Era a carne das árvores elástica e dura,
Eram as gotas de sangue da resina
E as folhas em que a luz se descombina.

Eram os caminhos num ir lento,
Eram as mãos profundas do vento
Era o livre e luminoso chamamento
Da asa dos espaços fugitiva.

Eram os pinheirais onde o céu poisa,
Era o peso e era a cor de cada coisa,
A sua quietude, secretamente viva, 
E a sua exaltação afirmativa.

Era a verdade e a força do mar largo,
Cuja voz, quando se quebra, sobe,
Era o regresso sem fim e a claridade
Das praias onde a direito o vento corre."



Sophia de Mello Breyner Andresen - Paisagem, in Obra Poética I







sábado, 11 de agosto de 2012

A GARÇA

Tinha estado ali, quase toda a manhã. Quieta, como se fosse uma garça-estátua a imitar os homens-estátuas, mas sem o pratinho das moedas. Talvez, se tivesse posto uma rede diante, as pessoas dos barcos, ao passarem, lhe atirassem com um peixe e, assim, teria a sua subsistência garantida. Mas não! Ninguém lhe atirou um peixe sequer, nem ela se deu ao trabalho de mergulhar o bico para apanhar fosse o que fosse. Apenas iam tirando fotografias, à sua elegância e ao seu imobilismo.

Aquelas águas sujas, cheias da poluição dos barcos, de óleo e do gasóleo dos motores, de restos de comida, não convidavam ao petisco. Nem peixes havia, só aquelas taínhas escuras que comem os limos e as cracas dos cascos dos barcos e que bebem e respiram as águas poluídas a saberem a combustível.


(DO AUTOR - BAÍA DE HONG KONG)

Contemplativa, nem sequer olhava para a agitação e ruído do porto, e nem bulia, quando um barco mais ruidoso lhe passava uma tangente, apenas acompanhando o que o cabo de amarração à poita oscilava...

E só quando, do alto da amurada do barco vermelho, com o nome bem evidente em caracteres chineses e dourados, a anunciar um restaurante flutuante, o cozinheiro lhe deu três assobios é que ela levantou a cabeça, abriu as asas e, num voo curto mas gracioso, foi poisar no convés, junto à cozinha, para comer os restos do peixe fresco que ele lhe tinha preparado.

Depois, de papo bem cheio, levantou voo e partiu na certeza de que amanhã, por aquela hora, voltará ao mesmo cabo de amarração, para assegurar a sua sobrevivência. Em troca deixa-se fotografar, no seu imobilismo e graciosidade, para as centenas de turistas frequentadores do restaurante, actuando como chamariz para o mesmo.

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sexta-feira, 10 de agosto de 2012

LATADA



Foram-se enchendo devagar, os bagos daquelas uvas brancas de mesa, moscatel.

A videira, plantada há muitos anos atrás, foi crescendo em altura, sempre tratada e acarinhada pelo velho avô, e as uvas sempre foram abundantes e gradas. Na altura própria, iam-se colhendo os cachos, que se lavavam, não porque fosse muito preciso, mas mais para os refrescar do calor dos dias de verão. Assim, mais frias, as uvas ganhavam outro sabor e apeteciam muito melhor...

Quando chegavam os netos, nas férias do verão, saltavam para cima do banco de pedra e iam depenicando os cachos, bago a bago, causando, na zona de influência daquele banco, um desgaste prematuro da quantidade de uvas.

Era uma alegria, um contentamento, aquela casa, no verão, cheia de gente, feita de várias gerações...



(DO AUTOR - MONSARAZ)

Agora, que os velhos partiram definitivamente, ficou a casa, de banco vazio, de janela fechada, mas de cortina colocada, impecavelmente branca, como a avó se orgulhava!

E a latada lá continua, com as mesmas uvas doces, agora não tão cheias, nem tão gradas, porque deixou de ser tratada, apenas esperando a visita dos filhos e netos, emigrantes bem longe, que aparecem nesta época para matar as saudades, limpando e caiando a casa, e cuidando da cortina de renda da janela, trabalho das mãos habilidosas da velha avó, no tentar conservar uma vida e uma tradição que, cada vez menos, vai interessando as gerações mais novas... 



gkjg

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

MEDALHA DE PRATA


Fernando Pimenta e Emanuel Silva ficaram em segundo lugar na final de K2 1000 metros na canoagem e conquistaram a primeira medalha para Portugal em Londres 2012. A dupla terminou a apenas 53 milésimos do ouro.

Os portugueses seguiram na luta pelas medalhas durante toda a prova, mas na parte final aproximaram-se mesmo do ouro, tendo terminado a apenas 53 milésimos do primeiro lugar. A dupla portuguesa gastou 3.09,699 minutos e foi apenas batida pelos húngaros Rudolf Dombi e Roland Kokeny (3.09,646). Na terceira posição ficaram os alemães Martin Holstein e Andreas Ihle (3.10,117).

Esta é a notícia!

ESTE O MEU ORGULHO!

(DO AUTOR -  PUERTO DE ANDRATX  - MALLORCA)

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

PEIXES VOADORES

O mar de água lá em baixo, o mar do Alqueva, imenso, tranquilamente prisioneiro das margens compridas e recortadas que o contêm, vigiado e guardado por castelos, torres e praças fortes, que se dispõem pelos montes sobranceiros.

Lá, bem no alto, naquele Monsaraz das muralhas, das ruas de pedra, do castelo e da arena, um cardume de peixes voava, armado em catavento plural, com cada peixe fixado ao seu bastão de ferro, voando parados, todos, e apenas girando ao sabor dos ventos que se enrolam e agitam o ar ao passar pelas ameias das muralhas e do castelo.

Ao longe, nas alturas, as cegonhas vão passando tranquilas, olhando os peixes voadores, prisioneiros do seu destino, amarrados àquelas hastes de ferro que os impedem de voar, ansiosos, quem sabe?, por mergulharem nas águas azuis daquele lago que não se esgota com o olhar e que, irresistivelmente, os atrai... 


(DO AUTOR - DE MONSARAZ VOANDO SOBRE O ALQUEVA)




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terça-feira, 7 de agosto de 2012

EVOLUÇÃO



(DO AUTOR - BUSTO DE ANTERO DE QUENTAL - LARGO DOS MÁRTIRES DA PÁTRIA - PONTA DELGADA - SÃO MIGUEL - AÇORES)


"FUI ROCHA EM TEMPO, E FUI NO MUNDO ANTIGO
TRONCO OU RAMO NA INCÓGNITA FLORESTA...
ONDA, ESPUMEI, QUEBRANDO-ME NA ARESTA
DO GRANITO, ANTIQUÍSSIMO INIMIGO...

RUGI, FERA TALVEZ, BUSCANDO ABRIGO
NA CAVERNA QUE ENSOMBRA URZE E GIESTA;
OU, MONSTRO PRIMITIVO, ERGUI A TESTA
NO LIMOSO PAUL, GLAUCO PASCIGO...

HOJE SOU HOMEM, E NA SOMBRA ENORME
VEJO, A MEUS PÉS, A ESCADA MULTIFORME,
QUE DESCE, EM ESPIRAIS, DA IMENSIDADE...

INTERROGO O INFINITO E ÀS VEZES CHORO...
MAS ESTENDENDO AS MÃOS NO VÁCUO, ADORO
E ASPIRO UNICAMENTE À LIBERDADE."

Antero de Quental, in Sonetos - Evolução.




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segunda-feira, 6 de agosto de 2012

LIBERDADE

Ondas livres e soltas dum mar que toca, lá no fundo do horizonte, o espaço infinito; ondas que parecem lançar-se para o céu azul construindo castelos de nuvens, brancos, informes, que se desfiguram e se deixam levar, pela liberdade dos ventos, na liberdade apaixonada do tempo...

(DO AUTOR - PRAIA DE GUARAJUBA  - BAHIA - BRASIL)
"Aqui nesta praia onde
Não há nenhum vestígio de impureza,
Aqui onde há somente
Ondas tombando ininterruptamente,
Puro espaço e lúcida unidade,
Aqui o tempo apaixonadamente
Encontra a própria liberdade."

Sophia de Mello Breyner Andresen - Liberdade




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domingo, 5 de agosto de 2012

VOAR LONGE, VOAR ALTO


Voava alto, no ar de um céu rosado, no fim da tarde, voando livremente, voando longe, num voo maior que a ambição das suas asas, cada vez mais distante, à procura do seu destino no infinito do céu... como se fosse encontrar-se com as estrelas que estão para lá da dimensão do  próprio espaço...

(DO AUTOR - NOS CÉUS DA CULATRA - ALGARVE)

"Se teu sonho for maior que ti
Alonga tuas asas
Esgarça os teus medos
Amplia o teu mundo
Dimensiona o infinito
E parte em busca da estrela...

Voa alto!
Voa longe!
Voa livre!
Voa!

E esparrama pelo caminho
A solidão que te roubou
Tantas fantasias
Tantos carinhos
E tanta vida!


Voa alto!
Voa longe!
Voa Livre!
Voa!"


Ivan Lins - VOA












http://www.youtube.com/watch?v=0IrkDhscAMA

sábado, 4 de agosto de 2012

ONDAS APRESSADAS

Passava o dia naquelas águas!

Chegava manhã cedo e só ia embora quando a tarde já estava esquecida. Parecia, quase, um golfinho, sempre entrando e saindo das águas, surfando nas ondas, deixando-se ir embrulhado naquele tubo verde colorido, num equilibrar constante, quase chegando à praia morena... Mas logo lhe voltava costas e lá ia, mar adentro, em cima da prancha, à procura da onda apressada, enrolada e verde que lhe proporcionasse o surf do dia!

(DO AUTOR - NA PRAIA DE SÃO CONRADO - RIO DE JANEIRO)

"Uma após uma as ondas apressadas
Enrolam o seu verde movimento 
E chiam a alva espuma
No moreno das praias.

Uma após uma as nuvens vagarosas
Rasgam o seu redondo movimento
E o sol aquece o espaço
Do ar entre as nuvens escassas.

Indiferente a mim e eu a ela,
A natureza do dia calmo
Furta pouco ao meu senso
De se esvair o tempo.

Só uma vaga pena inconsequente
Pára um momento à porta da minha alma
E após fitar-me um pouco
Passa, a sorrir de nada."


Ricardo Reis - Uma após uma as ondas apressadas,  in Odes.

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sexta-feira, 3 de agosto de 2012

FLOR VERMELHA

(DO AUTOR - SANTO ESTÊVÃO)


"À sua passagem a noite é vermelha
E a vida que temos parece
Exausta, inútil, alheia.


Ninguém sabe onde vai nem donde vem,
Mas o eco dos seus passos
Enche o ar de caminhos e de espaços
E acorda as ruas mortas.


Então o mistério das coisas estremece
E o desconhecido cresce
Como uma flor vermelha."


Sophia de Mello Breyner Andresen - Como uma flor vermelha

quinta-feira, 2 de agosto de 2012

PÔR DO SOL

Todos os dias há um pôr-do-sol. 

A verdade é que nem sempre nos damos conta do momento em que acontece, não só porque se dá todos os dias, mas também porque, raramente, estamos disponíveis para observar o acontecimento.

E, se o fenómeno do ocaso é, por si, repetitivo, tem a particularidade de nunca ser igual, mesmo quando é visto do mesmo lugar, da mesma janela e sentado na mesma secretária... Seja porque o céu está limpo ou está com nuvens, seja porque o céu está mais azul ou mais avermelhado, seja porque os olhos que o vêem, naquele momento estão mais alegres ou mais tristes, seja porque seja...

O pôr-do-Sol, desta vez, ficou bem vermelho, da cor do dia quente que esteve, e riscado no ar pelo voo rápido e imprevisível das andorinhas atrás do jantar...

(DO AUTOR - PÔR DO SOL NO ALTO ALENTEJO)

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

BALEIAS

É costume vê-las no mar lançando o seu borrifo, bem alto, quando vêm respirar à superfície, deixando ver a bossa quando se passeiam descontraídas, meio submersas, ou atirando a cauda ao ar, antes do seu mergulho em profundidade. Depois, adivinha-se o seu percurso submarino pelas pegadas que vão deixando na superfície...

É emocionante uma ida ao mar para observar as baleias... o colocar do colete salva-vidas, a saída na lancha rápida mar afora, as indicações sobre o seu avistamento feitas pelos observadores na costa, os binóculos assestados, a máquina fotográfica pronta para entrar em acção... e depois as fotos, os repuxos, o dorso a deslizar nas águas, o encher dos pulmões, o levantar da cauda, o mergulho...

(DO AUTOR - MAR DOS AÇORES)
 
Agora em terra, assim, a passear-se na rua, a fazer publicidade em frente à própria empresa que proporciona os passeios para observar as baleias (whale watching), nunca se imaginara tal forma de promoção e angariação de clientes...

(DO AUTOR - PONTA DELGADA - AÇORES)



 Efeitos da crise?


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